15 de julho de 2010

Certificados públicos de reforma - habilidades!

Se há uns anos me pedissem para indicar o melhor ministro do anterior governo, apontava, sem hesitações, Vieira da Silva (VS), da pasta do Emprego e da Solidariedade. Porque fez uma reforma necessária e inevitável e soube explicá-la publicamente com paciência e competência.
Porém, uma coisa é conhecer as reformas e os ministros pela comunicação social e outra é conhecer as reformas e as medidas por dentro, como agentes ou utentes das mesmas.
Foi isso que aconteceu comigo quando, a dada altura, tendo-me libertado de um empréstimo bancário para compra de habitação, tendo entrado seguramente na segunda metade da vida – já que não viverei outros tantos anos – e procurando acautelar algum rendimento na reforma – se lá chegar –, decidi investir num plano de poupança-reforma.
Como acredito mais no Estado do que nos Bancos, optei por subscrever os certificados públicos de reforma. Além de a rentabilidade destes ser muita boa.
Comecei por pesquisar no site da Segurança Social (SS) e não consegui obter a indicação do local onde poderia fazer a adesão. A esta questão básica, apenas se diz:
«Para mais informações, consulte o panfleto informativo, dirija-se ao serviço competente da Segurança Social, contacte o nº 808 266 266 ou coloque as suas questões para [endereço de mail]»
O panfleto informativo não tem morada e o 808 266 266 também não me conseguiu informar, mandando-me para o meu Centro Distrital da SS. Aliás, pergunto se acaso ocorreu à SS substituir a frase «serviço competente da SS» pela designação e endereço do mesmo? Ou se acham que o cidadão tem de saber qual é o «serviço competente da SS»? Aliás, o número verde da SS, referido acima, é dos call centers mais incompetentes que conheço. Já o experimentei por duas vezes com maus resultados.
Fui, então aos serviços da SS em Entrecampos, dos quais fui recambiado para a Avenida dos Estados Unidos da América, onde finalmente me deram a morada certa: Alameda D. Afonso Henriques, n.º 82. Deixando-a aqui estarei seguramente a fazer serviço público, pois talvez ajude pelo menos quem é de Lisboa e tenha a mesma elementar questão.
O tal departamento funciona num rés-do-chão, de porta aberta. É exclusivo para esse assunto. Não há filas. A funcionária é jovem, simpática e de boa atitude. Foi chegar, ver e vencer. Consegui o que queria. Trouxe para casa a papelada. Li, sublinhei, coloquei questões e voltei lá uns dias depois.
E é aqui que verdadeiramente começa a história. Para quem não sabe, os certificados públicos de reforma são regulados pelo Decreto-Lei n.º 26/2008 de 22 de Fevereiro. Uma das questões que levava dizia respeito ao artigo 22.º, Transmissão por morte, no qual se refere: «na situação de morte do aderente antes de adquirido o direito ao complemento, o capital acumulado na sua conta individual é integralmente transmissível aos seus herdeiros legais». A minha pergunta era simples: saber se sobre este valor incidia algum imposto?! A funcionária referiu-me que essa pergunta havia sido colocada na formação que tiveram e que a resposta era negativa. Sobre o valor transmitido não incide qualquer imposto. Ao que eu lhe disse se era possível adicionar ao contrato exactamente essa expressão: «sobre o capital acumulado e integralmente transmissível aos herdeiros não incide quaisquer ónus ou encargos». Que era aliás o que devia dizer na lei. Aqui ela põe um ar de simpático paternalismo e informa-me que não vou assinar nenhum contrato mas apenas preencher um formulário de adesão e uma autorização de débito em conta. O formulário é parco em informação. Para além dos dados pessoais, pouco mais refere do que a base de incidência contributiva, ou seja, o meu vencimento, a taxa contributiva, ou seja, 4%, o respectivo valor mensal, e o NIF.
Não refere sequer:
  1. Que o regime público de capitalização, ao qual aderi, se rege pelo Decreto-Lei n.º 26/2008, de 22 de Fevereiro;
  2. Que se o Decreto-Lei n.º 26/2008, de 22 de Fevereiro, for revogado no todo ou em parte, eu posso resgatar o montante acumulado, acrescido, por exemplo, da taxa EURIBOR.
Isto seria o mínimo exigível.
Ou seja, amanhã, o Estado pode fazer incidir um qualquer ónus ou encargo sobre o valor acumulado e alterar a lei, virando-a ao contrário, como hoje vem acontecendo todos os dias, sem que eu possa fazer mais do que suspender, mesmo assim apenas no mês de Fevereiro de cada ano, a respectiva contribuição.
Eu duvido que o Estado autorizasse um Banco ou um Fundo de Pensões a comercializar deste modo leonino um produto semelhante.
Estes certificados foram anunciados pessoalmente por VS em conferência de imprensa, pelo que ele decerto não ignora o modo como os mesmos funcionam. É por isso que eu agora quando o vejo noutras funções, onde aliás tem estado muito pior, olho para ele com muito mais desconfiança. Embora mais peneirada, aquilo parece-me farinha do mesmo saco, o saco de quem respeita pouco a lei e o Direito… Além de que com estes comportamentos o Estado se começa a parecer perigosamente com os Bancos... Ora, dos Bancos, defende-nos o Estado e do Estado quem nos defende?!?!

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