Exemplaridades
Assisti no passado domingo no Gato Fedorento a uma impagável paródia sobre o julgamento de Saddam Hussein, com declarações adulteradas do antigo ditador iraquiano referenciadas à Justiça da Pólis. Um must, esta caricatura do Gato. Porém, o que se passou na realidade, em Bagdade, não é porventura muito diferente daquilo. É que soube pelos jornais e revistas da Pólis deste fim-de-semana que o juiz que o condenou era um curdo da aldeia de Halajaba, que foi gaseada pelo exército iraquiano: exactamente um dos crimes dos quais Saddam era acusado?! Bush qualificou a sentença como «exemplar para a jovem democracia iraquiana». Não há dúvida de que andamos a chamar a muita coisa Justiça e a muita outra democracia...
Etiquetas: Justiça
21 Comments:
Caro Politikos, adepto, como adivinho que seja, do multiculturalismo, não sei com que se espanta. Deve, de facto, haver tantos conceitos de justiça e de democracia neste mundo quantas «culturas». Quanto ao Bush, as suas noções são, decerto, coincidentes com as nossas («cultura» ocidental), mas o rapaz, além de ceder ao odiozinho figadal que tem ao Saddam, quis dar nota de algum sentido de perspectiva…
De facto, existe em torno do conceito de democracia uma incerteza que decorre da diferente ponderação de alguns valores, v. g. a liberdade e a igualdade...
Por outro lado, a própria justiça tem sido distinguida segundo diferentes critérios, existindo muitas confusões, equívocos e controvérsias acerca das relações entre o direito e a justiça. Como diz Pieper, "entre as coisas que hoje nos importam poucas há, segundo parece, que não mantenham íntima relação com a justiça"....
Mesmo nas «exportações» de justiça e de democracia, minha cara Luar, há princípios basilares que têm de ser respeitados. Há-de convir que o caso, pelos seus contornos, não é de molde a orgulhar nenhuma democracia, nem mesmo as mais jovens... E o cinismo da «real politik» tem os seus limites...
Bom, cara Atenas, não faço da Justiça o centro das coisas. Há cidadãos da Pólis que podem passar a vida toda sem recorrer a ela. Quanto à justiça, bem, essa é bem diferente, mas essa existe pouco na Justiça. Nessa existe o Direito, que deixou de ser instrumental para se constituir num fim em si mesmo. Isto na minha modestíssima opinião, é claro. Volte sempre.
Parece-me, mais precisamente, que a justiça (iustitia) pressupõe o direito (ius), que é o seu objecto primordial. Aliás, filológica e onticamente, a iustitia provém do ius....
Fala-me de filosofia e eu falo-lhe da realidade, cara Atenas. É só essa a diferença! Não acredite em tudo o que lê! Olhe para a realidade e verá muito para além dos canhenhos de Filosofia do Direito.
O Politikos tem a mania de falar de justiça, ainda por cima põe-se a arguir com quem sabe da poda. Esta é outra deste cromo! É que não há condições, não há mesmo!
Os princípios da Lei de Talião foram, pela primeira vez, consagrados, há quase quatro mil anos, no velho código babilónico de Hamurabi, na região do actual Iraque. O «olho por olho, dente por dente» tem, portanto, tradições na justiça local…
Lá vou eu descer ao comezinho.
Depois de ter saltado o argumento delirantemente defendido na ONU {eu assisti em directo}pelo Colin Powell das ADM, não surgiu célere o conceito de exportação da democracia, tão caro aos neo-cons? Mas que democracia é esta em que os juízes ora têm medo, ora são parte interessada?
Quanto ao Bush, duvido que as suas noções sejam coincidentes com as nossas. Ao que consta, enquanto governador do Texas entrou para o Guiness "assinando" execuções. Claro que lhe faltava a forca no curriculum...
Os princípios da lei de talião, não de Talião, que não era nome de gente, se me permite a precisão, caro(a) q.b., são, como sabe, o mais antigo código de leis escrito, o que significa que nem tudo nasceu no eixo Europa/EUA e que os outros se calhar não são os bárbaros que nós achamos que eles são, pois até têm uma história e uma cultura milenares...
E desce bem, cara Maloud. Como era possível, aliás, instalar uma democracia e um Estado de Direito credível num país onde primeiro se destruiu o Estado?! Não sabia que o homem tinha entrado no Guiness por esse palmarés?!
Caro Politikos, agradeço a sua achega a propósito das maiúsculas. Tenho, de facto, alguma tendência para abusar delas em quanto se trate de identificar leis – decerto pelo muito respeito e temor que me inspiram. Também julgo saber que as maiúsculas estão um pouco «démodées». E COMO NÃO CONSIGO LIBERTAR-ME DESTE PERNICIOSO ESPÍRITO DE CONTRADIÇÃO… :-D
Cara q. b. (contexto retirado da frase "enquanto mãe de uma estudante do secundário"), seria interessante activar os comentários no seu blog. Estou inteiramente de acordo com essa frase, porque enquanto pai de um estudante do 7º ano, verifico que nesta altura, entre faltas e graves, o meu filho já teve 42 tempos de faltas de professores desde o início do ano lectivo. Isto no espaço de dois meses, portanto. Só em Língua Portuguesa já vai em 12. Seria uma interessante discussão saber se a culpa é dos pais, dos alunos ou da ministra... Sim, porque no que se refere aos professores, há sempre uma razão para as faltas, que nunca é imputável aos próprios. Isto quando é a classe profissional que tem menos horas de trabalho efectivo por semana, mais tempo disponível para fazer o que quer, mais dias de férias por ano (quando todos os outros têm de estar a trabalhar), a única que tem dias livres durante a semana... e a que mais reclama!
PS: Não é "graves", é "greves".
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Caro Kroniketas, pela minha parte, já perdi a conta aos «furos» de que a pequena tem «beneficiado». Mas o mais grave é que, depois de onze anos no privado sem um único «furo», está a tomar-lhes o gosto... e ainda a apanho, um dia destes, numa manifestação. :-)
Então e as aulas de substituição, meus caros Kroniketas e Luar? Supostamente, os furos já acabaram?
Luar?!!!
Há muitos estabelecimentos de ensino público, caro Politikos, que ainda não instituíram a prática das aulas de substituição. O da minha filha é um deles. Penso que o do filho do Kroniketas será outro.
Cara q.b. Peço-lhe antecipadamente desculpas a si e à Luar pela involuntária troca de identidades. Pensei que não havia escolha e que a coisa já era obrigatória. A julgar pelas suas palavras, ainda não. Vou ter de tirar isso a limpo. A bem da Nação.
O meu filho tem aulas de substituição, sim senhor, mas segundo ele diz não servem para (quase) nada. O problema de fundo não é esse: é que até ao dia 24 de Novembro já faltaram 13 tempos de português, 10 de inglês, 8 de estudo acompanhado, 5 de francês, 4 de ciências, etc etc... Essas aulas não dadas já não as recupera.
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