5 de outubro de 2006

Idomeneo e MST

Tem sido glosada até à exaustão a decisão da directora da Ópera de Berlim de suspender a produção da ópera Idomeneo, de Mozart, onde, a certa altura, se apresentam as cabeças cortadas de Buda, Cristo e Maomé, por receio de represálias dos terroristas islâmicos. Pressurosamente, os opinion makers da Pólis, todos, criticaram a decisão como uma capitulação ao terrorismo, incensando a liberdade ocidental. Na blogosfera, os opinion makers, os candidatos a opinion makers e os outros alinharam pelo mesmo diapasão. Não consegui ver uma única opinião em sentido contrário. Pessoalmente, acho que a directora da Ópera agiu com prudência. Pessoalmente, se estivesse naquela posição, faria exactamente o mesmo. Não existem valores absolutos, nem sequer a liberdade que, aliás, é um dos - senão mesmo o - valores que eu mais prezo. O que me parece é que estas vestais, esta espécie de libertários à outrance, se arvoram em paladinos de um tipo de liberdade absoluta, de uma liberdade sem responsabilidade, de uma liberdade indeterminista que nunca existiu. O maior exemplo de liberdade é exactamente a possibilidade de escolha e escolher como escolhemos não nos diminui, não nos menoriza, nem significa medo. As condicionantes da liberdade não anulam a liberdade. E não nos esqueçamos de que todos os dias, todos – inclusive as tais vestais - praticamos pequenos e grandes actos de auto-censura. Lembrei-me disto a propósito de um texto de Miguel Sousa Tavares (MST) publicado esta semana pelo GEPP (nome que O Expresso tem neste blogue), acerca da entrevista de José Maria Aznar, ao Prós e Contras, e onde a certa altura refere a opinião do antigo director do jornal a propósito da invasão do Iraque: «a menos que se aceite a extraordinária tese então defendida aqui no Expresso pelo arq. José António Saraiva de que só invadindo é que se poderia saber se havia ou não armas […]». Ora todos, e o Pólis&etc. à cabeça, reconhecemos a independência e o desassombro de MST em relação a tudo que é poder na Pólis. Se há algum opinion maker independente é MST. É um jornalista que nunca se rendeu aos cantos de sereia do poder e que atira indistintamente à esquerda e à direita. Tirando alguns temas residuais em que cega e irracionalmente defende a sua dama, mas até, nalguns casos, declara previamente interesses: tabaco, FCP, caça e touros, por exemplo, MST encarna – quase todos concordarão - a máxima independência do comentário político da nossa Pólis. Alguém, porém, acredita que se o arq.º Saraiva (é também curiosa a manutenção do título) ainda fosse director do jornal, MST escreveria aquilo… Alguém, ademais, acredita que, com aquela espécie de autismo anti-crítica de que o GEPP sofre, tal seria publicado…

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2 Comments:

Blogger Politikos said...

Pelos naturais mecanismos de auto-censura, cara Luar. O exemplo de MST serve apenas para provar que todos, mesmo os mais frontais e directos de nós, se auto-censuram e que a tal liberdade absoluta não existe. Felizmente...
O mais curioso em si, cara Luar, permita-me que lhe diga, é essa mistura de reacção com revolução...
Acha que se capitula alguma coisa não ensaindo o Idomeneo?! Não é por aí, cara Luar, não é por aí...
A propósito, acha que ele diria aquilo se o JAS fosse director do jornal?
Quanto aos comentários, correcções de comentários e adendas de comentários, espero que seja só nisso que se pareça com o tal comentador que refere ;-)

quinta-feira, outubro 05, 2006 10:09:00 da tarde  
Blogger Politikos said...

Cara Luar, nota mal: não introduzi nenhuma alteração no meu «visual». Quanto às alterações na sua «casa», já me ofereci, dentro das minhas limitadas competências informáticas, para ajudá-la nesse «transe»...

domingo, outubro 08, 2006 1:13:00 da tarde  

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