16 de janeiro de 2010

Assim não vamos lá... Take two, action...

Como já aqui relatei, há tempos fui, pela primeira vez, a um Tribunal da Pólis na qualidade de testemunha, num processo de regulação do poder paternal, em que a parte que tem a criança quer mais dinheiro. Após ter esperado, e comigo outra testemunha, horas pela audiência, a Justiça não me ouviu e não teve sequer a consideração de me explicar por que razão não tinha sido ouvido ou tinha dispensado o meu testemunho depois de o ter aceite e agendado.

No final do julgamento, a juíza marcou a leitura da sentença: aumenta ou não aumenta a pensão de alimentos para um mês depois?!?! Transcorrido o dito mês, que aquela sentença deve carecer de uma complexa fundamentação de facto e de direito, o advogado desloca-se lá para ouvir a leitura da sentença, o que, em si mesmo, já é disparatado, na era da tecnologia, em que podemos fazer quase tudo a partir de casa. E, não havia qualquer sentença! Havia sim uma dilação por mais vinte dias! Razões alegadas: uma das partes requereu documentos actualizados a 2010 relativos aos rendimentos da outra parte e a douta juíza está a analisá-los. Como os rendimentos dessa outra parte são do trabalho e irão sofrer apenas uma actualização percentual despicienda, imagino que sejam necessários grandes cálculos matemáticos para a douta juíza se pronunciar e que esses documentos novos sejam realmente tão relevantes e complexos que precisem de mais vinte dias de ponderação para a sua análise... A desculpa foi tão esfarrapada e tão miserável que o próprio advogado se sentiu compelido a dizer que: «ela provavelmente não tinha era feito o trabalho-de-casa a tempo e que se tinha desculpado com aquilo!» Já que ela insultou a nossa inteligência, o advogado pelo menos, não!

Temos, assim, por junto, mais de dois meses para obter uma sentença de uma chocante simplicidade... Ora, quando ouço muitos dizer que as manobras dilatórias são sobretudo culpa de advogados menos escrupulosos, o que este caso parece provar é que os juízes também não estão isentos de responsabilidades... Parece que os juízes sofrem anualmente inspecções de outros juízes ao seu trabalho! Não discuto o método, mas neste caso o que deveria existir era uma linha verde, azul ou o que fosse para o Conselho Superior de Magistratura ou que fosse que permitisse aos cidadãos queixarem-se da demora da decisão, de modo a que alguém dissesse peremptoriamente à juíza : «despache lá isso, s.f.f.»! Claro que, pelo estatuto da magistratura judicial, isto é impensável que possa vir a acontecer, mas não tenho dúvida nenhuma que era o que devia acontecer e o que os tempos exigem. Enquanto não se colocar alguma pressão de eficácia e de eficiência sobre os agentes, isto não muda nunca...

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11 Comments:

Blogger fugidia said...

Ora, Politikos, ao contrário do que julga - e pese embora não seja propriamente com um «despache lá isso, s.f.f.»!, o CSM diz, sim, aos juizes para despacharem o processo.
Claro, é necessário que haja queixa fundamentada (e soube da boca de uma grande amiga advogada que a mais das vezes os advogados não explicam lá muito bem aos seus clientes o porquê de algumas demoras).
Portanto, o meu conselho é que o advogado apresente queixa o quanto antes.
Ass.: Mafaldinha a contestatária :-)

domingo, janeiro 17, 2010 3:28:00 da tarde  
Blogger Luísa A. said...

Politikos, vinha com intenção de juntar ao seu o meu «mata e esfola». Ou, como fez ontem, no «A Torto e a Direito», o Francisco Teixeira da Mota, sugerir o esquema dos alertas: ao cabo de uma semana sem sentença, declarava-se ao juiz o alerta amarelo; ao cabo de um mês, o alerta laranja; ao cabo de um trimestre, o alerta vermelho; e ao cabo de um ano, «fuzilava-se». :-D
Mas com a nossa Fugidia por aqui, calo-me já, com mil pedidos de perdão… ;-)

domingo, janeiro 17, 2010 5:00:00 da tarde  
Blogger fugidia said...

lolololol

(Luísa, até a mais velha perguntou se eu estava bem, tão sonora foi a minha gargalhada)
:-)))

domingo, janeiro 17, 2010 5:41:00 da tarde  
Blogger fugidia said...

P. S.
E, já agora, quais seriam os alertas e consequências para os demais «operadores judiciários» (ugh, expressão esta...)?
:-D

domingo, janeiro 17, 2010 5:44:00 da tarde  
Blogger Politikos said...

Sim, sim, Fugidia/Mafaldinha, já sabemos que a culpa nunca é dos juízes, é sempre ou dos «senhores funcionários» ou dos advogados... E se esses não chegarem, temos sempre os políticos, o alfa e o ómega de todos os nossos males... Mas nunca por nunca dos juízes... Quanto àquilo a que chama «queixa fundamentada», imagino que se refira a umas laudas de papel escrito com todos os ademanes da arte e conversa da treta, o que só para ter resposta demoraria meses e seguramente não daria em nada... Já não estamos nesse tempo, Fugidia! Agora quer-se uma coisa ágil, rápida: uma chamada do cidadão queixoso, outra chamada do CSM, nesse mesmo dia, para o juiz titular do processo. As explicações do dito convencem. Telefona-se ao cidadão e explica-se o porquê. Não convencem, dá-se uma ordem directa ao juiz para fazer aquilo em 24 horas. É isso que acontece no mundo real!

Luísa, não vi o programa mas parece-me interessante a ideia do Teixeira da Mota. Ainda que um pouco romântica, como aliás o personagem, que por acaso até estimo. Já deixei em cima uma boa forma de operacionalizar a coisa, com a certeza, porém, de que tal não irá nunca acontecer! Aquilo, a coberto de uma putativa-independência, é um Estado dentro do Estado! E mesmo os mais musculados políticos não ousam meter-se muito por ali! Veja o caso de Sócrates: umas mudanças no mapa judiciário e uns benefícios de saúde e eis tudo!

domingo, janeiro 17, 2010 8:39:00 da tarde  
Blogger fugidia said...

Politikos, onde é que no meu comentário está escrito que
- «a culpa nunca é dos juízes»?, ou que
- a «queixa fundamentada» é escrita «com todos os ademanes da arte e conversa da treta, o que só para ter resposta demoraria meses e seguramente não daria em nada»?
E porque imagina/presume que não é «uma coisa ágil, rápida»?

«Uma chamada do cidadão queixoso, outra chamada do CSM, nesse mesmo dia, para o juiz titular do processo. As explicações do dito convencem. Telefona-se ao cidadão e explica-se o porquê. Não convencem, dá-se uma ordem directa ao juiz para fazer aquilo em 24 horas. É isso que acontece no mundo real!»
Em qual mundo real?; se alguém tem poder de decisão (e refiro-me quer ao poder público quer ao privado) lamento sinceramente que seja tratado da maneira que descreve, com um «quero posso e mando» ou pior: «manda quem pode, obedece quem quer».
Mas claro, isto é a minha opinião – e não veja aqui nenhuma ironia, sff (tal como no meu conselho final, que reitero: que o advogado apresente queixa).

Bom resto de domingo e boa semana.

domingo, janeiro 17, 2010 9:01:00 da tarde  
Blogger Politikos said...

Fugidia
Se no «post» anterior o problema era da funcionária que não explicou porque não fui ouvido e neste o problema é do advogado que não explicou bem porque não são proferidas as decisões, sobra quem no sistema?
No caso concreto que relato, e com os dados que aqui apresento, se tiver de escolher um responsável para o atraso na decisão, entre juiz e advogado, qual escolhe?
Presumo que demoraria meses e que não daria em nada porque não me parece haver ali matéria para queixa? E porque tudo na Justiça demora uma eternidade? Acha sinceramente que aquela queixa daria nalguma coisa? Ou afirmou e reitera agora a ideia de que o advogado se deve queixar com o despeito e a sofisma de quem já sabe de antemão que isso não daria em nada?
No mundo real, significa nas organizações públicas e privadas, onde há metas, objectivos, avaliação de desempenho! A mim dão-me muitas vezes ordens directas e eu tb as dou a outros, e naqueles exactos termos, «by the way»! Ah, e tenho impressão de que há um problemazito com o seu último aforismo, é que é «manda quem pode, obedece quem deve»... mas admito que na Justiça tenha a redacção que lhe deu...
Um bom resto de domingo tb para si e uma excelente semana de trabalho

domingo, janeiro 17, 2010 10:40:00 da tarde  
Blogger fugidia said...

Politikos,
com todo o respeito, tenho uma enorme dificuldade em argumentar consigo quando o vejo sistematicamente a tomar a parte pelo todo.
No post anterior o meu comentário não versou só sobre a funcionária mas também sobre a funcionária.
No primeiro comentário deste post o "problema" não foi só o advogado; foi sobretudo contradizer a generalização do seu post e, também, chamar a atenção para algo que sei apenas pelo que me foi dito por outra advogada.
Sobre especificamente os juízes, creio que, tanto neste como no post anterior, os meus comentários foram no sentido de também (e não só) os responsabilizar. Neste, em particular, porque não dei nenhum conselho irónico e sim, acho sinceramente que a queixa, a ser válida, daria resultados.
Posso assegurar-lhe que sou uma pessoa intelectualmente honesta e quando brinco ou sou irónica esforço-me por o revelar através de "bonecos". Não foi, naturalmente, o caso.
E, de novo, lamento que receba e dê ordens naqueles termos.

O Politikos pode opinar como e quando entender, com base em meras ilacções ou pelo que tem conhecimento através da comunicação social ou pelo que tomou conhecimento através de estudo. Aliás, sobre isto, já argumentámos bastamente.
Mas eu posso, creio, chamar a atenção para situações não versadas nos posts sem que, por isso, se possa concluir que discordo de si na totalidade.

Obrigada pelos desejos finais.

domingo, janeiro 17, 2010 11:07:00 da tarde  
Blogger Politikos said...

Fugidia
Generalizar é o que todos nós fazemos sobre tudo. Fazemo-lo, simplesmente porque nunca podemos conhecer o todo. Apenas conhecemos partes do todo, uns conhecem uma parte maior, outros menor. Acontece que quando o todo nos diz directamente respeito, dói-nos mais...
Se reparar ainda, sou bastante disciplinado na argumentação e cinjo-me estritamente ao que é dito. E se reparar tb, respondi, sem fugas, a todas as suas perguntas...
Quanto aos juízes, neste «post», o comentário sobre os advogados foi no sentido de os desculpabilizar. Sendo intelectualmente honesta, – coisa que nunca esteve em causa – certamente que o reconhecerá.
Não lamente as ordens que eu recebo e dou, que eu tb não! É normal. E mais, porque tenho algumas responsabilidades institucionais – ainda que em pequena escala – assumo muitas vezes as culpas que não são minhas e faço muita coisa que não seria suposto eu fazer, mas sim pessoas situadas em níveis mais abaixo...
No caso, opinei não sobre o que li nos «media», nem pelo que li algures mas pelo que vivi. Eu estive lá. Eu vi as maneiras daquela senhora, eu esperei, eu não fui ouvido, eu conversei com a funcionária, com o advogado, eu li, aliás, o processo, etc., etc.
E sim, pode naturalmente aduzir as situações não versadas nos «posts» e o que entender pertinente, sendo, naturalmente, contraditada por isso.
Renovo os votos de uma boa semana de trabalho

domingo, janeiro 17, 2010 11:51:00 da tarde  
Blogger fugidia said...

Quando falei do todo e da parte, falava da contradita de V. Excia aos meus comentários, Politikos: porque eu não estava a contradizê-lo «tout court» :-)

Já se sabe que nunca resisto a uma boa troca de argumentos consigo, embore ache que ficamos sempre a perder nestas caixinhas tão minúsculas. Temos de resolver isto!
:-D

terça-feira, janeiro 19, 2010 12:36:00 da tarde  
Blogger Politikos said...

Eu sei que falava do meu contraditório, Fugidia. Apenas lhe devolvi o argumento, sublinhando que Vexa tb generalizou: «a mais das vezes os advogados não explicam lá muito bem aos seus clientes o porquê de algumas demoras»! Como é que sabe que é a maior parte das vezes e não algumas ou poucas ou muito poucas?! Todos generalizamos, Fugidia.
Já percebi que não gosta das apertadas caixinhas de comentários e prefere os os amplos espaços das grandes laudas... É se calhar um problema da repolhuda «arte» jurídica ou talvez prefira o «vis-à-vis», confiada na sua presença física ou na sua capacidade de hipnotizar o outro... :-)
Escolha «as armas» e os termos, Fugidia. I'll be there. :-D

terça-feira, janeiro 19, 2010 10:02:00 da tarde  

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