8 de março de 2009

Technicolor II

Continuando na boa onda do tecnicolor, mais um filme que não é a preto e branco: O Leitor, belíssimo filme, da que parece ser a boa safra de 2008. É um filme intuitivo sobre o crescimento interior do intérprete masculino que faz um notabilíssimo percurso pessoal, que vai do desejo físico do jovem de 15 anos por uma mulher mais velha, à paixão por ela, à culpa, ao remorso, ao dilema moral para impedir uma condenação severa, à remissão, quando lhe fornece cassetes com livros gravados, à compaixão e à gratidão, quando providencia o acolhimento aquando da libertação, à catarse final do destino a dar aos seus bens pessoais, e por fim à absolvição, com a confissão final à filha. É uma viagem íntima, pessoal. Fundamental, fundamentalíssimo no seu percurso – ele é advogado – é a compreensão, ainda estudante, da diferença entre a moral e a lei, e de como a lei, por si só, é quase sempre muito incompleta para entender e julgar o mundo. A diferença entre o legalismo do professor de Direito, do colega a preto e branco com quem discute no auditório, e do próprio juiz do julgamento de Nuremberga e os que a procuram compaginar com a moral e com a ética, é igualmente um por(maior)menor relevante.
Kate Winslet tem um desempenho notável de uma mulher rude, que não chega a entender completamente o mundo que a rodeia, que responde primitivamente aos impulsos, sem qualquer crivo moral, que cumpre rotineiramente o que lhe mandam, sem se interrogar. Também aí a maldade é desmistificada. Ela não é a encarnação absoluta do mal. É apenas uma mulher rústica, quase ignorante, que acreditava cumprir o seu dever. Não lhe faltam, porém, a sensibilidade no maravilhamento com a literatura, a honestidade da sua postura no julgamento, a dignidade na morte.
Viva o tecnicolor!

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3 Comments:

Blogger Luísa A. said...

Outro a não perder, caro Politikos. A propósito de julgamentos com os dados frios da justiça e os dados quentes e realistas da «moral», estou a ler a biografia de uma das irmãs Mitford, Diana Mosley, que casou com o líder do movimento fascista britânico e foi amiga pessoal de Hitler nos anos que antecederam a guerra. E é extraordinário como, contextualizados os factos, tudo era tão inocente, natural e compreensível. Tão natural e compreensível quanto nos parece a sua «diabolização» no pós-guerra. É por isso que nunca somos donos do nosso destino, porque as circunstâncias podem alterar de tal modo a ordem das coisas que o que antes não tinha mal aos olhos do mundo, passa a tê-lo aos mesmos olhos. São os riscos de não podermos ver o futuro, mas podermos rever o passado. :-)

quinta-feira, março 12, 2009 1:30:00 da manhã  
Blogger Politikos said...

Tem razão, cara Luísa, este filme é a não perder. Não conheço o caso de que fala, mas não podemos ignorar que a cobardia e o sentido de sobrevivência podem fazer não querer ver o óbvio ou apenas ver o que se quer ver. Essa situação também aconteceu por cá no Estado Novo. É diferente estarmos a falar de esbirros, como uma carcereira, ignorante e básica ex-cobradora de bilhetes, como em O Leitor, ou de líderes de movimentos...

sexta-feira, março 13, 2009 11:42:00 da manhã  
Blogger T said...

Ofereci o livro que originou esse filme a uma amiga:)
Li a história das irmãs Mitford. A Unity teve um triste e prolongado fim aliás. Tentativa de suicídio por não conseguir conciliar os dois mundos em guerra.
Prazer em lê-lo caro vizinho:)

quarta-feira, abril 01, 2009 9:19:00 da tarde  

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