8 de março de 2008

Salazar e «os democratas»

O Ministro dos Assuntos Parlamentares, Augusto Santos Silva, referiu, ontem, quando confrontado com algumas afirmações proferidas numa manifestação de professores:
1.º E cito, «certas pessoas não sabem distinguir entre Salazar e os democratas»;
2.º Que aquelas pessoas não têm autoridade moral para proferir aquelas afirmações;
3.º Que autoridade moral para isso têm ou tinham Mário Soares, Salgado Zenha, Manuel Alegre, Jorge Sampaio;
4.º Que autoridade moral não tinha ou não tem Cunhal e Mário Nogueira.
Ora, estas declarações são profundamente lamentáveis.
1.º E mais importante, porque o Ministro não reflecte sobre as razões que levam os manifestantes a comparar «os democratas» a Salazar e se calhar devia;
2.º Porque afirma ter mais autoridade moral do que os manifestantes, não se sabendo quem lha reconhece;
3.º Porque oblitera directamente a acção de Álvaro Cunhal e indirectamente dos comunistas na luta contra a ditadura;
4.º Porque coloca, completamente a destempo, Mário Nogueira nesta discussão;
5.º E último, porque ao invocar essa pretensa autoridade moral, ele não reconhece o direito de opinião aos manifestantes, acabando por lhes dar, de certo modo, razão para aquelas afirmações.
Ora, o que ele devia fazer mas não faz, porque está impante e verbalmente destemperado com a maioria absoluta que tem, era reflectir sobre as razões pelas quais surgem essas comparações... Não me vou pronunciar sobre as afirmações em concreto e sobre as razões objectivas dos manifestantes porque não as conheço...
Mas pessoalmente encontro um exemplo - aliás já por aqui referido - de um caso que considero poder suscitar uma comparação lícita entre a prática de Salazar e a prática dos «democratas»… É a lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, que «estabelece os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas», através da qual o Estado, dito de Direito, altera retroactivamente milhões de despachos e os termos dos «contratos» celebrados com centenas de milhares de funcionários públicos...
Além disso, o Ministro tem de perceber que o que distingue a Democracia da ditadura é exactamente o direito de todos compararem tudo...

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9 Comments:

Blogger T said...

Caro P:
Gosto deste epíteto de "certas"às pessoas que ousam pensar e exprimir-se .É falácia comum.
Afinal a democracia não é a liberdade de todos compararmos e dizermos?
Plenamente de acordo com o que diz. Hoje vi as imagens da manifestação e fiquei comovida, apesar de todos os recuos que possa ter a alguns aspectos organizacionais da mesma.
Bom fim de semana.

sábado, março 08, 2008 10:54:00 da tarde  
Blogger Politikos said...

Cara T
O homem perdeu a tramontana perante o que lhe disseram. Vi depois na televisão que, entre outras coisas, lhe chamaram «fascista». Ele não se aguentou e saiu-lhe aquilo.
Já quanto à manifestação de hoje, eu acho que há fundadas razões de queixa dos professores no tocante à forma como algumas questões foram conduzidas, mas pouca no que respeita à substância da coisa.
Bom fds para si tb

domingo, março 09, 2008 12:05:00 da manhã  
Blogger T said...

Caro P:
É. Acredito. E avaliados são todos os funcionários públicos com quotas determinadas para excelentes prestações.
Para a mim a manifestação deveria ter sido conjunta. De qualquer forma e como já dissse, tocou-me.
Beijinho

domingo, março 09, 2008 12:44:00 da manhã  
Blogger Politikos said...

Cara T
O SIADAP e as quotas não são nenhuma forma de premiar o mérito, são uma forma de poupar dinheiro e evitar as promoções e as progressões na carreira. E desse modo, com total verdade, devia ser assumido. Não tem mal nenhum num cenário de finanças públicas como o que temos. Tem é que se assumir isso, assim mesmo. Com verdade.
É evidente também que os funcionários públicos não docentes - exceptuo os que continuam nomeados definitivamente: juízes, magistrados do MP, inspectores, polícias, etc. - se deviam organizar e manifestar em relação a alguns aspectos, como o que aponto no poste. Isto, claro, se tivessem à frente nos sindicatos alguém com o gabarito do Mário Nogueira, que manifestamente não têm.
Percebo o porquê de a ter «tocado» a manifestação dos professores. É sempre agradável assistir a certas manifestações cívicas. É quase um sinal de crença no Povo que somos. Mas não se iluda, quando ouvi as declarações dos professores entrevistados, fiquei com a sensação clara do «espírito corporativo» que por ali vai...
Não propõem nenhuma alternativa. Um disse mesmo que não queria nenhuma avaliação. Ora, isso não é aceitável.
Abç

domingo, março 09, 2008 10:14:00 da manhã  
Blogger T said...

Caro P:
1-Eu não sou contra as avaliações. Estranho é as noções de qualificação que vão ser exercidas, com lotações já definidas. Aliás já vou ser assim notada este ano e estou pouco ralada com o facto. Faço o que sempre fiz, que é o melhor que sei.
2-Apartadas as águas, de um lado os manifestantes, de outro os líderes sindicais, o que será que a manifestação produzirá em termos práticos? Nada? Aguardo para ver.

domingo, março 09, 2008 11:48:00 da manhã  
Blogger Politikos said...

Cara T
1 – Sobre as avaliações, as quotas servem para poupar dinheiro e retardar as promoções e as progressões a quem fique fora delas, ou seja, 75% dos funcionários; eu já notei e fui notado pelo SIADAP desde 2005; pessoalmente também não sinto que faça melhor, preocupo-me é mais com o cumprimento dos objectivos e tenho aquela «espada» sempre em cima, o que não é mau;
2 – Não poderá ser ignorada, formalmente vai haver uma mudança na atitude, mas substantivamente o processo é para continuar; não pode ser de outra forma.
Abç

segunda-feira, março 10, 2008 2:06:00 da manhã  
Blogger T said...

Caro P:
Também gosto de funcionar por objectivos, tendo metas claras. Este ano para mim será a primeira vez. Mas também em termos de progressão já estou despachada, até que resolvam mudat todo o sistema e zás.
Um abraço

segunda-feira, março 10, 2008 12:32:00 da tarde  
Blogger Luísa A. said...

Meu caro Politikos, concordo inteiramente com o que diz. O ministro parece querer defender direitos de exclusividade sobre a democracia. Admito que alguns não possam entrar no jogo, mas não, seguramente, os que só usam a palavra como arma. Acho que essa gente do poder anda visivelmente desnorteada.
P.S.: Também, como à T, me tocou a manifestação. A multidão em movimento por uma causa, qualquer que ela seja, tanto me assusta, como comove.

terça-feira, março 11, 2008 2:17:00 da manhã  
Blogger Politikos said...

Cara Luísa
Concordo com o desnorte, mas creio que é mais soberba. E, como disse à T, não se iluda com a «causa». Ali, mais do que «causa», há muita «corporação». Creio que a sua concordância com o teor do meu poste e o seu sentimento para com a manifestação são mais ideológicos que outra coisa. Mas, sobre o primeiro, não se iluda, a minha discordância, não se significa que me vá bandear para o lado oposto.
;-)

quarta-feira, março 12, 2008 10:25:00 da tarde  

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