30 de agosto de 2006

Valências camilianas


E como estamos numa de Camilo, deparámos nas páginas do Courrier Internacional (CI, n.º 70) com um anúncio de página inteira, publicitando o Centro de Estudos Camilianos, em S. Miguel de Seide. Graficamente bem concebido, o anúncio da Câmara Municipal de Famalicão conta com duas frases de apresentação, uma da ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, e a outra do presidente da autarquia, Armindo Costa, e logo por baixo apregoam-se as valências da Casa de Camilo, porém escritas «valéncias»... Ora isto não teria grande importância: um acento agudo em vez de um circunflexo, no meio das asneiras que se vêem escritas por toda a parte na imprensa, não é coisa de palmo... O caso é que aquilo vem logo por baixo da tal frase do autarca em que se diz:

«Para além de espaço de cultura, de defesa e estudo da língua portuguesa, a Casa de Camilo, com a obra projectada por Siza Vieira, assume-se também como um pólo turístico que projecta o Município de Famalicão em Portugal e no Mundo».

Valha a verdade, porém, que num segundo anúncio, publicado no mesmo CI (n.º 72) duas semanas depois, o erro já aparece corrigido. Decerto por voz camilianamente atenta...

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29 de agosto de 2006

Haverá solidão maior?

Há um bom par de anos atrás na zona onde à época morava (um subúrbio inóspito da capital), morreram duas idosas esmagadas por um camião. O caso foi localmente bastante falado devido ao facto de o passeio se encontrar sobrelevado em relação à estrada, necessitando-se, por isso, de subir e depois descer os respectivos lances de escadas. A maioria das pessoas - ademais idosas com dificuldades de locomoção - optava por caminhar na própria estrada. Mais do que a brutalidade do ocorrido, impressionou-me o facto de as idosas terem estado cerca de 15 dias na morgue até que os familiares reivindicassem os corpos. O que dá bem a medida da solidão nas cidades.
Há dias soube de um caso que também me impressionou. A minha mãe assistiu no cemitério à passagem de um funeral em que além do padre e dos cangalheiros só estava a viúva já muito velha... Não consigo vislumbrar, confesso, um momento de maior solidão...

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A crise?! Qual crise?

Segundo o Economia do GEPP (n.º 1763, para quem não saiba é O Expresso), o preço do metro quadrado da construção nova em Lisboa atingiu um novo recorde: 6000 mil euros, praticado nos condomínios das Janelas Verdes, junto ao Museu de Arte Antiga, e do Convento dos Inglesinhos, no Bairro Alto. Superaram-se assim os 5000 euros atingidos na Torre de S. Gabriel, no Parque das Nações, e nos Terraços de Bragança, no Chiado. O mesmo Economia do GEPP (n.º 1762) já havia revelado que o Pine Cliffs, um novo resort (já vi a palavra aportuguesada para resorto) do Algarve, pagou um milhão de euros, fora o transporte, por duas alfarrobeiras centenárias (dir-se-ia talvez milionárias) para colocar à entrada do empreendimento. Acrescente-se que as pobres alfarrobeiras – a alfarroba servia sobretudo como alimento para o gado - estão praticamente votadas ao abandono por todo o Algarve. É claro também que todos estes empreendimentos (residenciais e turísticos) são considerados topo de gama... Admite-se que os de gama média e baixa teriam, por certo, umas quaisquer palmeirinhas à entrada...
A crise?! Qual crise?

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27 de agosto de 2006

Os números da Super Liga

Agora que começou (parcialmente) a Super Liga e em que ouvi na rádio uma notícia de teor muito semelhante ao deste poste, cozinhado em férias, torna-se oportuno postá-lo agora. Gosto de futebol, mas ligo mais ao jogo jogado do que ao jogo falado. De onde procuro ver os jogos ao vivo ou pela televisão mas leio poucos jornais desportivos. Excepção feita ao fim-de-semana e às férias. Pois nestas, a instâncias do elemento mais novo da família, comprei o Guia de Futebol 2006-2007 do Record. Entre números e nomes vários, descobri um valor curioso: o do orçamento do FC do Porto para a época que agora começa: 40 milhões de euros. Ou seja, o dobro do orçamento do Sporting: 20 milhões. E quase o mesmo dos orçamentos de Sporting e Benfica juntos: 45 milhões. O número global dos orçamentos de toda a Super Liga é de 128,8 milhões de euros, de onde o orçamento do FCP abarca quase um terço do valor dos orçamentos somados de todos os clubes da Super Liga. E deixando de fora os três grandes, o orçamento dos restantes clubes é praticamente igual ao orçamento do FCP: 43,8 milhões. Não sei se é de pedir ao FCP triunfos condizentes com esta notória superioridade orçamental, mas se assim fosse, poder-se-iam desde já encomendar as faixas...
Já agora, uma nota final para o facto de, ainda deixando de lado os três grandes, o maior orçamento ser o do Marítimo: 7,5 milhões, seguido de um outro clube da Madeira, o Nacional, com 5 milhões (porque será?!?!), e do Braga, igualmente com 5 milhões... A Académica, com 4,5 milhões, o Boavista com 4, o Belenenses, com 3,75, e o Aves, com 2, aparecem logo em seguida. Os restantes estão todos abaixo dos 2 milhões...

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25 de agosto de 2006

A colangite de EPC...

Eduardo Prado Coelho (EPC) deu uma entrevista à Visão (n.º 700). A entrevista aparece na secção Cultura e tem por título Claro que sou coscuvilheiro. Entre coisas mais ou menos interessantes sobre a sua vida, declarações mais ou menos interessantes do próprio, fotografias mais ou menos interessantes (uma aliás em nu integral com um ano de idade...), ficámos a saber que EPC sofre de colangite... E, como o próprio, pressurosamente logo esclarece: «uma doença típica dos países nórdicos, mas rara nos do Sul». Até nas doenças os intelectuais da Pólis são diferentes... Quais vulgares colites, quais carapuça: são colangites, senhores... Ficámos também a saber, pela autora da entrevista, que EPC é o «protótipo do intelectual português»...

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23 de agosto de 2006

Macho Man segundo Camilo

Foram algo discutidas em certo blogue luso as virtualidades do que se chamou o Macho Man. A questão comportou classificações de tal bicho, apreciações várias dos leitores e sobretudo das leitoras. A bem dizer as principais clientes de tal espécime. E já se sabe que o cliente tem sempre razão... No fundo, o tal blogue reduzia o o bicho-homem a dois grandes grupos, o dos brutos cavernícolas e a cheirar a cavalo e o dos sensíveis andróginos que deixavam grossas dúvidas quanto à sua condição... E advogava-se, com maiúsculas e tudo, que os «OS HOMENS NÃO DEIXASSEM OS SEUS CRÉDITOS POR MÃOS ALHEIAS». Expressão um bocado críptica, que não mereceu do tal blogue grande esclarecimentos, apesar das instâncias do Pólis&etc... Ora o Pólis&etc. ficou a matutar nesta frase – até porque gosta de agradar às clientes e agradar às clientes é conhecer as suas preferências, como se sabe - e nestas férias, voltou a Camilo, tendo lido ou relido várias obras. Eis, pois, o que descobriu nas páginas de Eusébio Macário:
«As matilhas assanhadas ladravam ao cadáver do lobo, e algum cão mais ousado puxava-lhe pelo rabo, sacudindo a cabeça com frenesi. O lobo foi disputado aos caçadores pelos habitantes da aldeia vizinha, que tinham direito a seis mil réis com que a Câmara gratificava o matador; mas os de Montalegre diziam que aparecesse o homem que o matara, e estavam a termos de o levar, porque o morgado do Corujão, dado a pompas venatórias, lhe queria a pele para tapete da cama, e falava em embalsamar a cabeça. Nisto, Felícia para desatar as dúvidas, disse em segredo a umas vizinhas que quem matara o lobo fora o senhor padre Justino de Padornelos. Espalhou-se logo o caso, foi muito admirada a valentia do padre, e um lavrador abastado, o Chanca, mandou uma cabra e um cabrito de presente a Felícia, e que dissesse ao senhor padre que, se precisasse de alguma cousa, ele estava às ordens para o servir, e que assim é que se queriam os homens. Daí por diante Felícia quando ia a um cerco, romaria ou festa de igreja longe, o povo apontando para ela, dizia: «Aquela é a fêmea* do padre que matou o lobo» (p. 46).
Resta ainda transcrever, em jeito de conclusão, a preciosa nota de Alexandre Cabral, o editor-literário da versão que lemos:

* «Em Terras de Barroso e nas limítrofes a mulher em mancebia é uma “fêmea”; reduzem-na às condições mais fisiologicamente animais que podem. A casada não é fêmea, nem mulher: é a “patroa”. “A minha patroa”, diz o marido».

Também temos aqui uma interessante classificação para as mulheres: fêmeas ou patroas... Fica por esclarecer se este é um bom exemplo de Macho Man, se para se ser Macho Man se tem de matar um lobo – pensaremos naturalmente num equivalente moderno e ecologicamente mais correcto para a situação... Fica ainda por esclarecer se com a expressão Macho Man se procuraria, tal como em Terras de Barroso, reduzir o homem «às condições mais fisiologicamente animais»...

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21 de agosto de 2006

Os nossos prolixos bloguers...

De vez em quando aparecem pela boca de alguns intelectuais e opinion makers da Pólis: os suspeitos do costume, algumas referências vagamente depreciativas em relação aos blogues e aos bloguers da Pólis... Como se as coisas do espírito e o ter opinião fosse uma coutada daqueles. Não é! Desta vez foi Daniel Oliveira no Grande Educador do Povo da Pólis (nome comum: O Expresso - n.º 1762) que se refere, a (des)propósito, na sua coluna semanal aos «nossos prolixos bloguers»... Não sei porquê mas acho que esta democratização do espaço público de opinião trazida pelos blogues causa uns certos engulhos àquelas classes...

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19 de agosto de 2006

Os novos civis…

Nunca deixo de me surpreender com a capacidade dos falantes da Pólis em recriar a língua, fazendo-a avançar e evoluir. Concordando ou discordando. E assim nestas férias descobri, numa daquelas notícias típicas de tempos sem notícias: «notícias de férias», um curioso uso da palavra «civis». Foi no dia 11 de Agosto, na RTP 1, uma bióloga falava de um programa de recuperação de cágados que haviam sido lançados numa lagoa do Algarve. A dada altura da reportagem, e referindo-se à origem dos animais, a bióloga sai-se com esta (cito de memória): «[…] antes os cágados eram detidos por civis […]». Ora, habituado que estou ao uso da palavra civil por oposição a militar, quando muito também a eclesiástico, embora este claramente em desuso, acho muitíssimo curioso que quem não seja biólogo seja civil… E se a moda pega às restantes profissões?!

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18 de agosto de 2006

Os novos Index ou a falência do Estado de Direito

Take 1 – Os particulares e as dívidas
Há praticamente 20 anos adquiri a minha primeira habitação própria nos subúrbios de Lisboa. Prédio novo e novos donos: todos proprietários. Qualidade que adquiri antes mesmo de ter um emprego decente e/ou proventos adequados à condição. Tão contente estava com a minha propriedade que fui adiando até onde pude a mudança para lá. E permaneci até ao limite dos limites em propriedade arrendada, ou seja, duas assoalhadas exíguas no centro de cidade. Ia, porém, pagando o condomínio da minha propriedade e acompanhando à distância a administração do prédio, como competia a um bom, responsável e novel proprietário da Pólis. Uns dois ou três anos depois, fui surpreendido com a instalação de um pequeno armário com duas portinholas de vidro e uma fechadura-cadeado no átrio da propriedade. Bondosa e ingenuamente, pensei que o dito armário serviria para a afixação de anúncios ao condomínio. Nada mais errado! O objectivo prioritário do dito era afixar a lista dos condóminos devedores. E a coisa resultou. Foi mesmo remédio santo. Num ápice resolveram-se quase todas as situações de incumprimento, permanecendo alguns casos avulsos de devedores crónicos e de alguns profissionais do ofício. O opróbrio social do index funcionou na perfeição. Há pouco tempo, na zona onde vivo – uma conhecida e movimentada artéria de Lisboa – a administração de um condomínio decidiu afixar na porta principal do prédio e bem visível da rua um grande placard com a indicação da dívida de um estabelecimento comercial que ocupa um das lojas. A coisa parece ter resultado, pois só lá vi o papel durante uns dias. Mais um caso de remédio santo. Mais uma vez o opróbrio do index funcionou na perfeição.

Take 2 – O Estado e as dívidas
Está disponível desde ontem, no site da Segurança Social a Lista de Grandes Devedores à Segurança Social, e desde finais de Julho, no site da Direcção-Geral dos Impostos, a primeira Lista de Grandes Devedores ao Fisco. Parece que neste último caso, a operação foi um sucesso e antes de a mesma ir para o ar já haviam sido cobrados 20 dos 130 milhões de euros em dívida. Parece que a ideia é ir até ao mais pequeno devedor e será extensível a outras áreas. Parece ainda que o próprio Estado vai dar o exemplo e vai divulgar a lista dos seus próprios incumprimentos. Aplaude-se!

Take 3 – Epílogo
Há nestes dois casos duas situações só aparentemente semelhantes. Ambas, porém, com a mesma causa. Ora no primeiro take deste filme negro, a situação passava-se entre particulares ou entre empresas. Recorrer à Justiça para recuperar aquelas dívidas era trabalhoso, caro, moroso e de duvidosa eficácia, de onde recorria-se ao opróbrio da sanção social... Agora, porém, a roca fia mais fino e isto acontece entre o Estado e os particulares e entre o Estado e as empresas. Ou seja, o Estado reconhece oficialmente, hoje, tal como os particulares já o haviam feito, ontem, a absoluta ineficiência e ineficácia do sistema judicial de que dispõe para conseguir cobrar pelos meios legais adequados as suas dívidas... E isto porquê? Para não mexer na sacrossanta independência do poder judicial: princípio velho e relho - na sua configuração moderna com mais de dois séculos –, estimável e necessário, por certo, mas que quando levado ao limite dos limites, como é o caso, gera fenómenos perversos. Mexe-se na saúde e acaba-se com as listas de espera; mexe-se na função pública, avaliando por objectivos e criando supranumerários... Mas não se faz a tão necessária reforma de Justiça (a tíbia revisão do processo penal e uns acertos na distribuição do mapa judiciário não é nada). O que estes novos index mostram é apenas e só – e não é nada pouco – o reconhecimento oficial pelo Estado de que a Justiça não funciona... É para mim o sinal até agora mais evidente da absoluta falência do Estado de Direito...

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Algarve em Agosto

Ainda é possível, como se vê... Só para conhecedores... ;-)

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