O Governo e a sociedade clamam contra o endividamento das famílias mas pouco fazem para o limitar. Nesse endividamento generalizado – crédito para a compra de casa, de carro e de outros bens de consumo (electrodomésticos, roupas, férias) – a parcela maior é invariavelmente a primeira: o crédito à habitação. Resta dizer que ainda tenho um crédito desses. Dos outros não tenho, nem quero.
O contrato que negociei com a instituição bancária onde tenho esse crédito estabelece que posso liquidar anualmente até 50% do valor do empréstimo contra o pagamento de uma taxa de serviço de €125. Se liquidar mais de 50% num mesmo ano, pagarei, além da dita taxa de serviço, mais 2% sobre o valor da entrega. Andei às turras num processo que acabou mal com uma outra instituição bancária que me queria cobrar 7% por toda e qualquer liquidação antecipada?!?!? É verdade, 7%?!?! Por um triz, faria jus aos célebres onzeneiros vicentinos...
Os bancos querem-nos agarrados!
Quando celebrei o meu actual contrato, tinha a minha antiga casa integralmente paga mas ainda por vender, daí que tivesse particular cuidado na negociação dessa cláusula. Quando a vendi, cerca de um ano depois de pedir o empréstimo, o banco tentou demover-me de proceder à liquidação antecipada do capital, acenando-me com miríficos e rendosos produtos, numa atitude que roçou o que chamo de prática comercial agressiva. Claro que não cedi, mas tive de usar de alguma assertividade para que a minha zelosa gestora de conta me largasse a labita. As diferenças entre estas práticas e o time-sharing de rua foram mínimas: a moça estava mais bem vestida, é um facto; a abordagem foi feita entre quatro paredes e não na rua, sim senhor; a abordagem fez-se a coberto de um emblema de prestígio da finança internacional, é claro! O modo de fazer, a agressividade e o condicionamento ao cliente, porém, foram muito idênticos...
Decididamente, os bancos querem-nos agarrados!
Sabendo disto tudo, o Banco de Portugal estabeleceu, há já algum tempo, algumas regras para minorar estas práticas. Hoje é possível liquidar a todo o tempo o capital dos empréstimos para crédito à habitação e os bancos apenas podem cobrar a tal taxa de serviço e uma comissão de no máximo 0,5%. Eu acho que não deviam poder cobrar comissão nenhuma, quando muito a tal taxa de serviço e não no valor que cobram.
Então eu vou liquidar ou amortizar o empréstimo, representando um cada vez menor risco para o banco e ainda sou penalizado… Devia ser penalizado era por não pagar e não por pagar!? Por pagar, devia até ser beneficiado, eventualmente com uma redução da taxa de juro e do spread. O cliente que representa menos riscos devia ser um bom cliente mas é um mau cliente.
Um bom cliente é agora um cliente agarrado!
E o que dizer do facto de, por fazerem uma transferência da minha conta à ordem e introduzirem os novos valores nos simuladores do crédito à habitação e do seguro de vida, imprimindo um novo plano de empréstimo e uma nova apólice (aquilo é uma simples folha), operação que demora uns minutos a um funcionário e se traduz em duas folhas de papel impresso de imediato, que nem sequer assinadas são, me cobrarem €125…
Não é, pois, de estranhar, que os bancos engordem cada vez mais. Só assim é possível que, por exemplo, o maior banco privado português, o Millenium BCP, como refere A Visão da semana passada, se tenha valorizado em 5 meses – repito, 5 meses - mais de 28%. Exacto, mais de 28%! Ou seja, 13 mil milhões de euros.
Acho que está tudo dito, não?!
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